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Casa de apoio Vovó Gertrudes recebe crianças em tratamento contra o câncer

Publicado em 11/05/2015 Editoria: Florianópolis Comente!


foto: AVOS/Divulgação

foto: AVOS/Divulgação

A casa laranja de dois andares no alto do morro da rua Rui Barbosa, na Agronômica, é vista de longe. Por fora, ela se parece como outra qualquer, mas aqueles que são convidados a conhecer e até mesmo morar no local por algum tempo sabem que de comum ela não tem nada. A casa fica em frente a uma grande construção amarela, com um quintal repleto de banquinhos para descanso, vendedores de brinquedos e estacionamento para vans de diversas cidades de Santa Catarina. A grande construção é o Hospital Infantil Joana de Gusmão e o imóvel laranja é a Casa de Apoio da Vovó Gertrudes, acomodação que passou a abrigar crianças em tratamento contra o câncer no começo deste ano.

A casa é mantida pela Associação de Voluntários do Hospital Joana Gusmão (AVOS) e possui 1.826m². Em cada um dos quartos dos 20 apartamentos, além da cama de solteiro e outra hospitalar- para facilitar o atendimento do médico à criança, há armário e banheiro. Cada quarto possui um quadro de filme ou livro infantil, pintado por uma voluntária AVOS na parede.

O Pato Donald é quem alegra o quarto 13, onde estão hospedados Leandro, 11 anos, e a mãe Maria Batista. Eles vieram de ônibus de Caçador e demoraram cerca de oito horas para chegar ao Hospital Infantil. Leandro está com leucemia, tipo de câncer no sangue que começa na medula óssea e nas segundas, quartas e sextas-feiras ele faz quimioterapia para tratar a doença. A casa de apoio da Vovó Gertrudes é seu lar desde o dia 15 de abril e continuará sendo até receber alta do hospital.

Foram investidos 2,5 milhões de reais para a construção da casa, sustentada com a ajuda de 5.394 doadores. Apesar de ter sido inaugurada há um ano, o imóvel só passou a receber crianças em janeiro de 2015 devido a problemas com alvarás e infiltrações. Atualmente, no espaço convivem em média dez crianças em tratamento contra o câncer e seu acompanhante, na maioria das vezes a mãe.

O auditório com capacidade para 50 pessoas, a área de lazer, cozinha e refeitório, sala de informática, capela ecumênica e brinquedoteca são os espaços que as crianças hospedadas na casa de apoio têm para passar o tempo quando não estão fazendo exames. A brinquedoteca é o lugar mais frequentado pelas crianças e suas mães.

Sentada em uma cadeira de plástico pequena na sala com estantes cheias de bichos de pelúcia, legos, quebras cabeças, carrinhos e bonecas está uma mulher de traços indígenas com longos cabelos pretos e calça com estampa de onça. Enquanto o filho Leandro se entretém com um quebra cabeça, ela se concentra no cachecol de tricô que está fazendo. Com a fala embargada, comenta sobre os 11 dias que o garoto ficou internado no hospital. A família descobriu a doença uma semana antes de vir para Florianópolis. “Ele estava indisposto, não queria brincar ou comer. Nós desconfiamos que havia algo errado, já que ele é tão espuleta”.

Maria e o filho nunca tinham viajado para tão longe. Eles também não planejaram como seria a estada no hospital, apenas vieram. O negócio de salgadinhos para festa de Maria está parado e o pai de Leandro, que é torneiro mecânico, só vê aos sábados e domingos.

No dia 1º de maio, o pai e o irmão mais velho vieram para Florianópolis. Foi o primeiro final de semana em que Leandro foi liberado para sair do hospital desde o começo da internação. A família foi ao Parque de Coqueiros e parou para comer um hambúrguer. “É difícil e ainda não temos previsão de quando voltaremos para Caçador. O foco agora é a recuperação dele e daqui a dois anos, o tratamento será reavaliado”.

Do outro lado da sala, uma mulher loira de olhos azuis se distraía fazendo decorações de mesa de crochê. Suas feições delicadas combinavam com a blusa rosa de babados e chinelo de lacinho que usava, mas destoavam da mão desgastada do trabalho na roça.

Lissani Ham Weirich ficará no quarto 3 da casa por mais dois dias, para que seu filho Mateus, três anos, termine os exames de análise da leucemia. Essa, no entanto, não é a primeira vez deles no espaço. Desde o começo do ano, mãe e filho vêm ao Joana Gusmão uma vez por mês para o acompanhamento do caso de Mateus.

Lissani e o filho são de Arabutã, cidade do interior catarinense a 19 quilômetros de Concórdia. A viagem de oito horas até Florianópolis com o carro da saúde –como chama carinhosamente, não é novidade para eles. No dia 20 de abril fez um ano da primeira internação de Mateus e desde então as jornadas entre o hospital e a cidade natal tornaram-se parte da rotina da família. “Eu nunca desfaço a mala. Ela está sempre pronta com algumas mudas de roupa, em caso de algum imprevisto acontecer”.

Em 2014, a internação de Mateus durou 42 dias, mas a mãe e o menino não puderam ficar na casa- que ainda não estava funcionando. Eles se hospedaram em outro lugar de acolhimento do hospital, com capacidade para 19 pessoas e quartos coletivos.  Lissani destaca que na Casa de Apoio da Vovó Gertrudes há mais privacidade e espaços de atividades. Nas primeiras vezes em que ficou no local, Mateus não gostava de brincar ou interagir com as outras crianças e as voluntárias. Ficava agarrado na mãe. Agora, a brinquedoteca é onde ele prefere estar.

Quando observado de longe, o pequeno aparenta estar em colônia de férias e não parece ser possível que ele saiba o que está acontecendo ou da gravidade de sua doença. Contudo, a mãe garante que ele sabe. No período da primeira hospitalização de Mateus, a família só conseguiu voltar para Arabutã um final de semana, pois o menino não melhorava. Ele, com apenas dois anos, reclamava de dor de barriga e perdeu muito peso. Chegou a dizer para a mãe, como em uma conversa de adultos que “não iria ficar bom”.

Mateus foi internado em Arabutã no sábado de páscoa do ano passado, queixando-se de dor nas pernas e com vômito. Na ocasião o médico tratou para virose, mas com as análises do exame de sangue e histórico familiar, a família foi encaminhada para o Hospital Infantil Joana Gusmão um dia depois. Eles ainda não sabiam como seria o tratamento, mas Lissani e o marido já desconfiavam que o filho pudesse ter câncer, dado o histórico do avô materno, que morreu de leucemia aos 48 anos.

Uma páscoa depois, pouca coisa mudou, uma vez que a mãe não sabe dizer que rumo tomará a doença de Mateus. E talvez a situação não mude mesmo. Mas, Lissani, assim como tantas outras mães que passam pela casa de apoio, aprendeu a apreciar pequenas felicidades.

Como quando Mateus reaprendeu a assobiar. “Antes de ficar doente, ele tinha aprendido. Mas, depois ficou fraco e parou”, lamenta. Para mostrar a experiência, ela chama o menino, que montava pecinhas de lego, e pede para que ele junte os pequenos lábios e assobie uma canção. Mateus prontamente atende o pedido da mãe, que abre o sorriso e bate palmas, comemorando o feito do pequeno.

A AVOS

A Associação de Voluntários de Saúde do Hospital Infantil Joana de Gusmão, iniciou as atividades em agosto de 1975, tendo como função atuar voluntariamente na humanização do atendimento e dar mais qualidade de vida e de tratamento para as crianças do Hospital Infantil Joana de Gusmão.

No subsolo da casa de apoio, há um espaço de call center, com cinco meninas que trabalham ligando para pedir doações. São 5.394 doadores fixos e cinco motoboys fazem o recolhimento do dinheiro. São as doações que mantem a casa, e a própria AVOS funcionando.

Entre 20 e 30 voluntários estão todos os dias no hospital. Rita Dualeng, agente de viagens, comparece todas as quintas-feiras à tarde na área de oncologia do hospital. Voluntária há dois anos, ela resume o sentimento de quem tira uma tarde para ajudar os outros.  “Não sei se é melhor para eles ou para mim”.

 

 

› FONTE: Floripa News (www.floripanews.com.br)

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