Rafael Lara, o Rafa, tem 10 anos e frequenta o 3º ano do Ensino Fundamental, na Escola Básica Municipal de Florianópolis Intendente Aricomedes da Silva (EBIAS), na Cachoeira do Bom Jesus. Assim como todos de sua idade, ele adora correr, pular e brincar com os colegas. Com determinação, ele não deixa que a paralisia cerebral o impeça de ser criança e estudante de uma escola de ensino regular.
Sua lesão afetou a parte motora do cérebro e isso acarretou uma perda parcial da motricidade, o que prejudica sua locomoção, sua fala e apreensão de objetos, como segurar o lápis.
Depois de uma breve passagem pela EBIAS, Rafa mudou-se para o Paraná e ficou um ano desligado do sistema de ensino. Em 2016, então, tornou-se novamente estudante da unidade. A partir daí, o foco da educação dele foi também no desenvolvimento da autonomia em atividades da vida diária, como comer, usar o banheiro sozinho e a retirada das fraldas.
Esse trabalho é feito com o suporte da professora auxiliar da educação especial, Neusa Bernardi, que neste ano letivo colabora para que o Rafa possa expandir a compreensão e respeito dos tempos e espaços escolares. Ela também contribui com a confecção de materiais adaptados e na orientação das atividades para o estudante.
Aliado a isso, professores da sala de aula regular e professores de educação especial passaram a definir juntos o planejamento, as avaliações e as estratégias pedagógicas que favoreçam o acesso ao currículo e aprendizado de Rafael. O trabalho colaborativo, envolvendo professores, equipe pedagógica e direção escolar é fundamental para que Rafa participe do processo de aprendizagem junto com os seus colegas, pois a desvantagem da deficiência não está na lesão, mas no ambiente hostil à diversidade física, que lhe confere um outro estilo de vida.
O aprendizado
Em sala de aula, os materiais oferecidos para Rafael são, na sua maioria, são adaptados às suas necessidades físicas e cognitivas. Como paralisado cerebral, ele não tem controle motor amplo e fino, ou seja, não consegue segurar objetos com autonomia. Portanto, as atividades escolares são adequadas ao seu ritmo de aprendizagem, que têm tempos diferentes da dos seus colegas. Quando a professora trabalha separação de sílabas, Rafa recebe a mesma tarefa que os demais, mas com materiais de suporte concreto e abordagem diferenciada.
As professoras da educação especial Rosângela Kittel e Ruth Mary dos Santos explicam que a professora regente Débora Marques Lange, que em anos anteriores já atuou como professora Auxiliar da Educação Especial, oferece recursos pedagógicos adaptados que ela mesmo confecciona, de acordo com os conteúdos trabalhados na turma.
Por exemplo, Rafa tem uma prancheta com prendedores de roupa, onde cada grampo tem uma sílaba que deve ser colocada em pares com a sua correspondente. O objetivo na atividade de separar sílabas, que é trabalhar a segmentação da palavra guardando a relação fonema - grafema é preservada, somente alterando as estratégias de apresentação. "Muda-se a forma, mas o objetivo é o mesmo", relatam as professoras da educação especial.
Igualdade
Ele reconhece as letras e grafia do seu nome e já ensaia uma escrita. Atualmente, entende os tempos e espaços escolares: isso quer dizer que fica sentado durante as aulas que exigem essa postura, corre e pula na educação física, brinca com os colegas no recreio e vai ao refeitório para o lanche.
A sistematização do trabalho pedagógico adequado à sua necessidade foi determinante para que Rafael aprendesse os hábitos, atitudes, procedimentos e conhecimentos que compõem a cultura escolar.
“Sua aprendizagem tem um ritmo diferente dos seus colegas, mas o que importa é que todos aprendem juntos, na mesma sala, cada um com suas especificidades. Isso é a equidade, no exercício da igualdade, do direito de aprender", enfatiza a professora Débora Marques Lange.
As descobertas
A rotina de Rafael é igual a de muitas crianças da sua idade: ele acorda, toma café da manhã e vai assistir a desenhos animados. Ele também adora brincar no tablet, vendo vídeos e jogando. À tarde, é hora da aula.
Aline Cursino, a mãe de Rafa, relata que a evolução do menino a partir do início dos estudos na EBIAS é visível. "A escola ajudou muito, tanto no desfralde, como na independência dele. Hoje ele vai ao banheiro sozinho, pega água sozinho. É um menino muito inteligente!", conta orgulhosa.
Se não tivesse o apoio da escola, Aline não sabe o que faria. "A professora Rosângela é ótima! O Rafa não fala, mas demonstra que gosta muito de ir para a aula". Ela está tentando uma vaga na APAE, onde o filho teria acompanhamento complementar de profissionais especializados, com fonoaudiologia, fisioterapia e terapia ocupacional, mas existem ainda três crianças na frente de Rafa. "Provavelmente apenas para ano que vem", conclui.
Aline relata que Rafa tem uma relação de muito afeto com a irmãzinha, Ana Júlia, de três anos. "Ele cuida muito bem da irmã, é carinhoso. Tudo o que ela faz ele quer fazer também".
Rafa é curioso e sapeca. Segundo Aline, alguém sempre tem que estar de olho no menino, senão ele "apronta". A mãe conta com humor a última história: ele entrou no carro sem ninguém ver, ligou o pisca alerta e o rádio, virou a chave e deu ré no veículo. "A gente ainda não sabe como ele conseguiu dar ré! A sorte é que ele saiu devagarzinho e a nossa rua não é movimentada", finaliza a mãe.
A Educação Especial na rede
Atualmente, a rede municipal de ensino de Florianópolis possui 569 estudantes com algum tipo de deficiência. Deste total, 175 estão na Educação Infantil, 362 no Ensino Fundamental e 32 na EJA – Educação de Jovens, Adultos e Idosos.
Dentre as deficiências estão a auditiva, podendo ser perda parcial ou perda total; a visual, podendo ser a cegueira ou baixa visão; a intelectual; a física, sendo paralisia cerebral ou outro tipo; e ainda o Transtorno do Espectro Autista e a Superdotação/Altas Habilidades.
A EBIAS, unidade de ensino de Rafa, possui 13 alunos com deficiência, mas como destacam as professoras da educação especial, são 23 professores envolvidos com esses estudantes em suas salas de aula e é lá que o trabalho de inclusão acontece quando se promove a aprendizagem desse público. Portanto, é necessário estabelecer uma rede de apoio à docência para que a diversidade dos alunos seja contemplada, com Braille, Libras, tecnologia assistiva ou recursos pedagógicos adaptados e estratégias diversificas de ensino. Essa é a ênfase do trabalho colaborativo entre os professores da educação especial e da sala de aula regular.
A intervenção pedagógica
O trabalho educacional do Rafa é realizado em diversos tempos e espaços de práticas pedagógicas como sala de aula, refeitório, pátio, recreio, nas aulas de educação física, enfim, em todos os lugares onde há interação com outros estudantes, professores e conhecimentos, pois são nesses cenários que a inclusão acontece.
Para isso, os serviços da educação especial que são organizados a partir da sala multimeios, oferecem além do atendimento ao aluno, a realização conjunta do planejamento com os professores de sala de aula; suporte e orientação às famílias; o diálogo com outras instituições que atendem a criança, como profissionais da APAE, fonoaudiólogas e fisioterapeutas; a confecção de material adaptado; e a proposição de adequações ao currículo escolar do estudante.
A proposta da sala multimeios foi organizada inicialmente em Florianópolis em 2002 e posteriormente transformada em política nacional pelo Ministério da Educação, em 2008. Essa nomenclatura é utilizada exclusivamente na capital catarinense, sendo chamada de sala de recurso multifuncional no resto do país.
Em 2016, o polo de Educação Especial EBIAS, localizado na Escola Básica Municipal Intendente Aricomedes da Silva, foi reestruturado. Assim, passou a apresentar condições para o desenvolvimento do trabalho com apoio à docência inclusiva.
O intuito é oferecer acesso ao conhecimento para que a aprendizagem se efetive como condição ao exercício da cidadania, desenvolvendo a autonomia e a independência dos estudantes com deficiência por meio do trabalho colaborativo entre professores da educação especial e professores de sala de aula regular.
Inclusão
Segundo o secretário de Educação de Florianópolis, Maurício Fernandes Pereira, quando são realizadas estratégias pensando nas especificidades, necessidades e potencialidades dos estudantes com ou sem deficiência, na pluralidade que é uma sala de aula, todos podem avançar no processo de conhecimento, autonomia e cidadania. "Rompe-se com a ideia do benefício de ensino em lugares separados ou segregados para estudantes com deficiência".
Ele afirma que o papel da escola vai além da transmissão de conteúdos: "Tem a função de mediar a experiência da convivência e interação das relações que ocupam o espaço educativo, formando uma geração de cidadãos sem deixar ninguém de fora", finaliza.
› FONTE: Assessoria de Comunicação da PMF