Pesquisa aponta defesa de novas fontes de recursos para melhorias no serviço e na mobilidade
&8203;Parlamentares e influenciadores do setor de mobilidade urbana defendem que o poder público deve assumir a maior parcela de responsabilidade pela qualidade e custeio do transporte público. É o que mostra a pesquisa Transporte como Direito Social. E Agora?, encomendada pela NTU (Associação Nacional de Transportes Urbanos), que ouviu 224 deputados, 25 senadores e 100 personalidades ligadas a diferentes setores econômicos, ao poder executivo de municípios, de estados e da União, além do meio acadêmico. O levantamento avaliou os impactos da emenda que tornou o transporte um direito social previsto na Constituição Federal, promulgada em setembro do ano passado.
Para 49,5% dos congressistas, o orçamento da União, dos estados e dos municípios deve ser aplicado com esse fim; 23,2% acreditam que as empresas empregadoras também têm de contribuir mais para o transporte público e 7% dos políticos acreditam que o mesmo vale para quem utiliza o transporte individual. No outro grupo, 33% sugerem que usuários de automóveis deem sua contribuição para custear o serviço e reduzir a pressão sobre a tarifa; outros 31% citam o orçamento público e 18%, as empresas empregadoras.
A FNP (Frente Nacional de Prefeitos) defende um novo tributo que seja destinado, exclusivamente, para investimento no transporte coletivo. A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) nº 179/2007, em análise no Congresso Nacional, sugere a criação da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) municipal. “Quando se fala na cobrança de uma taxa adicional pela União, nunca a redistribuição aos outros entes é feita adequadamente ou em tempo hábil. Mas quando se coloca a arrecadação gerida pelo próprio município, ela será paga na exata proporção do que o município precisa. Daí a justeza de uma Cide municipal”, defende o vice-presidente da entidade, Antonio Carlos Pannuzio.
Estimativa da NTU indica que, se o imposto implicasse um aumento de R$ 0,10 no preço do litro dos combustíveis, a arrecadação poderia chegar a R$ 11,7 bilhões anuais. Com esse valor revertido para o custeio do transporte público, as passagens ficariam 33% mais baratas. Ou seja, o valor médio das tarifas, que hoje é de R$ 3,60, cairia para R$ 2,40. “Com isso, você estimula as pessoas a procurarem o transporte público, enquanto o usuário do automóvel ajudaria a financiar esse serviço”, sustenta Otávio Vieira da Cunha Filho, presidente-executivo da entidade.
Outro argumento favorável à tributação é que o transporte individual é que ocupa a maior parte do espaço das vias urbanas. Em São Paulo, o índice se aproxima de 80%. Por isso, segundo o presidente da ANTP (Associação Nacional de Transportadores de Passageiros), Ailton Brasiliense Pires, usuários de automóvel deveriam contribuir mais. “A solução é coletiva. As cidades precisam de um transporte muito mais qualificado e, para isso, devem ser aplicados todos os recursos possíveis para baratear o serviço”, diz. Brasiliense Pires ressalta que os motoristas de carros também seriam beneficiados, pois o fortalecimento do transporte público levaria um número maior de usuários para os ônibus, reduzindo os congestionamentos.
Proposta enfrenta resistência
Quem defende a medida sabe que ela enfrenta resistência. Embora a PEC já esteja em análise por uma comissão especial no Congresso Nacional, a avaliação é que, por ser ano eleitoral, a proposta não deve ser levada a Plenário ainda em 2016.
O presidente do Conselho Superior e Coordenador de Estudos do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação), Gilberto Luiz do Amaral, acredita que, neste momento econômico, um novo imposto traria mais efeitos negativos que positivos. “Isso causaria impacto em toda a cadeia econômica. Se os governos já são incompetentes para aplicar a montanha de recursos que têm hoje, por que criar uma nova Cide? Não há espaço para isso, porque o consumidor vai pagar para ter uma diminuição na tarifa de transporte público e, em troca, um impacto nos preços de outros produtos e serviços afetados pelo custo dos combustíveis”, argumenta.
Outro desafio, mais subjetivo, é a cultura do carro. Esse é o entendimento do deputado federal Júlio Lopes, ex-secretário de Transportes do estado do Rio de Janeiro. "Há uma concepção nacional de que a sociedade movida pelo automóvel é melhor que a sociedade movida por ônibus. Há todo um trabalho de suporte de marketing, de ideologia, e o governo, nos últimos anos, subsidiou o automóvel", analisa. Para ele, isso exigirá um debate profundo, pois "não se trata apenas de vontade política, mas de uma vontade que tem que ser expressa pela sociedade".
O presidente-executivo da NTU pondera, por outro lado, que existe uma pressão significativa, nas cidades, contra aumento das tarifas no transporte público. Com o peso da inflação e o aumento dos custos operacionais do serviço, a elevação torna-se inevitável. Esse seria, para ele, um elemento favorável à proposta. "Nós acreditamos que esse recurso carimbado para o transporte pode dar certo. Os prefeitos poderão sair dessa agonia contra o não aumento da passagem, porque são duas alternativas: ou aumenta R$ 1,10 a passagem ou R$ 0,10 o litro do combustível. É um argumento que pode trazer benefícios para toda a sociedade."
Além disso, o presidente da ANTP, Ailton Brasiliense Pires, ressalta que andar de carro custa caro. Por isso, salienta que um transporte público de maior qualidade e mais barato beneficia a todos. "Há uma ideia de que andar de carro é barato. Mas não. Custa R$ 0,70 por quilômetro. Então, a ideia é que as pessoas tenham e usem o carro em deslocamentos diferenciados, não nos rotineiros. Não tem como ter espaço para todos. É uma questão de lógica e bom senso."
Otávio Vieira da Cunha reconhece, também, que a Cide municipal não é uma solução definitiva. “Existe muita coisa que precisa ser feita, inclusive a racionalização das redes de transporte. E é importante que ela ocorra até antes da subvenção, senão você estaria remunerando ineficiências do sistema.” É necessário, assim, reorganizar e integrar as linhas e os pontos de parada, melhorando o uso das faixas e corredores. Isso permite reduzir desperdícios, melhorar o atendimento à população e aumentar a velocidade dos veículos.
O tema foi debatido durante o Seminário NTU 2015 - Transporte como Direito Social. E Agora?, realizado em Brasília, nos dias 23 e 24 de agosto.
› FONTE: Agência CNT de Notícias